Não que ela tenha o visto,mas,minha avó dizia que o Saci existia sim.
As manhãs eram muito frias e nubladas.
Os cavalos tinham suas crinas todas trançadas. O cabelo das espigas também.
Era ele: só podia ter sido o Saci, aproveitando a escuridão.
Eita, moleque danado: bem pretinho, com uma perna só.
Dizem que ele usava um gorro vermelho e tinha um pito na mão.
Se o Boto servia de desculpa para as mulheres, para que serviria o Saci?
Para nada. Ele só gostava de pitar e trançar o milho e os cavalos.
Está certo que as senhoras o acusavam de culpado de tudo que elas fizessem de errado.
Coisas que elas não achassem,coisas que apareciam quebradas...
Há quem diga que o Saci é um espírito de criança abandonada pela mãe(Negra violentada pelo senhor,que abandonava o filho na boca-da-mata). Há quem diga que ele é uma assombração...
Minha avó dizia que a culpa é da luz,que, depois que puseram tanta iluminação,para todo lado, ninguém vê mais as assombrações...
No tempo dela não era assim, não.
Um dia era só para lavar os cabelos da mãe sela: ela usava tranças e enrolava na cabeça. Tinha olhos azuis e cabelos muito longos,pretos, que eram soltos no chão, enquanto ela ficava sentada. Para dormir, faziam uma fogueira no meio da casa e aproveitavam o calor.
Minha bisavó se chamava Angelina. Minha avó chamava-se Alzira.
Ela fugiu para não sofrer abusos de seu pai.
Foi com meu avô, de Campinas para Jau, casaram... mas, ela contava que, sempre que ele chegava do trabalho, pegava ela brincando de boneca, debaixo da mesa...
É difícil imaginar aquela mocinha, vendo-a entrar no nosso galinheiro e matando aquelas galinhas todas, para nos alimentar...
antipoema para a literatura branca brasileira
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por uma literatura de várzea
por uma literatura lavada de notas de pé de página
por uma literatura sem seguidores
por uma literatura não endogâmica...
Há 3 anos